terça-feira, 28 de dezembro de 2010

Mary & Max - Uma Amizade Diferente [2009]


(de Adam Elliot. Mary and Max, Austrália, 2009) Com vozes de Toni Collette, Philip Seymour Hoffman, Eric Bana, Barry Humphries, Bethany Whitmore. Cotação: *****

Filmes desenvolvidos com a técnica de stop-motion devem ser respeitados, acima de tudo, pela trabalhosa produção e o tempo destinado para a finalização de um único projeto. "Mary & Max", por exemplo, foi um projeto encaminhado por longos cinco anos pelo diretor e também roteirista do filme, Adam Elliot. Ele, que já tem uma carreira significativa em animações de curta metragem, tendo ganhado prêmios no Anima Mundi e um Oscar em 2003 por "Harvey Krumpet", seu curta de 22 minutos, fez de "Mary & Max" o seu primeiro longa metragem que traz muitos dos elementos característicos de seus trabalhos anteriores juntos numa história vivenciada por ele mesmo.

Mary Daisy Dinkle é uma garota de apenas 8 anos que mora no subúrbio de Melbourne Mount Waverleym, na Austrália. Sofre pela ausência do pai e a negligência de sua mãe depressiva e alcoólica, além do fato de ser rejeitada pelos colegas de escola, tendo que fabricar seus próprios brinquedos e assistir seu programa preferido em companhia de seu galo de estimação. Curiosa, ela escolhe aleatoriamente um nome americano numa lista telefônica e manda uma carta para perguntar de onde nascem os bebês nos Estados Unidos, além de oferecer sua amizade. A epistola é recebida por Max Jerry Horowitz, um ex-judeu (agora ateu) que sofre de obesidade e vive recluso em seu apartamento por ter dificuldades de se encaixar no mundo, que ele considera incompreensível.

Dessa relação por correspondência, nasce uma amizade intercontinental entre os dois que perdura por vários anos. Eles dividem a solidão que sentem, a falta de comunicação com o mundo que os cercam, o amor por chocolates, The Noblets (a animação de TV que eles assistem) e a carência. A narração da história é acompanhada por um irresistível humor visual, que garante à "Mary & Max" um título de tragicomédia. Seria incorreto atribuir ao filme um direcionamento infantil, pois a temática aqui é levantar questões que por vezes não são recomendadas às crianças não familiarizadas com citações como prostituição, preservativos, sexo, suicídio, alcoolismo, etc.

"Mary & Max" é profundamente melancólico. Os protagonistas aprendem de forma gradativa o conhecimento não só de si mesmos, como do outro. Isso em uma relação não presencial é algo não tão simples, ainda mais quando surgem discussões filosóficas sobre o amor, perdão, os tipos de pessoas que convivem entre si, depressão e vaidade. Mesmo com essas questões e a densidade do roteiro, tudo é abordado de forma ingênua, até porque se trata, antes de qualquer coisa, de uma animação, embora tenha sua cota de obscuridade. A fotografia diferencia os ambientes. Na Austrália, o tom sépia inunda o mundo de Mary e seus óculos garrafais, ao passo que a Nova York de Max é praticamente incolor. O que mais desejamos é a junção entre essas duas cores, que possivelmente tornará tudo mais singelo.

Com esses cuidados visuais e um roteiro que prima pela suas abordagens, "Mary & Max" se torna um filme extremamente profundo. Em certo momento, Max explica a pequena Mary seu problema patológico, Síndrome de Asperger. O caso é explicado por ele próprio através de conexões bem infantilóides, e consequetemente encantador pela simplicidade da obra, mesmo que insista em seus pontos polêmicos. A inscrição de “história real” tem fundamento. O roteiro foi baseado (livremente, é claro) pelo próprio Adam Elliot, que trocou correspondência por anos com um senhor que também sofria de Asperger. Ou seja, Mary funciona como alter-ego de seu criador.

"Mary & Max" é uma “animação desanimada” para gente grande saber o que é, de fato, a relação humana e suas peculiaridades.

Um comentário:

  1. Realmente é um filme que toca bastante nossos sentimentos guardados, se nos permitimos sermos tocados.
    uns amigos me falaram que estava passando em cinema de arte aqui e não pude assistir, por sorte ele entrou em cartaz em outro cinema e me possibilitou assistir, até estou procuramdo para comprar ou download, vale a pena ter na videoteca uma obra de arte dessas, parabéns pelo post

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